Hallertau, o mais novo jogo de fazendinha de Uwe Rosenberg, pode ser resumido exatamente com esta frase: o “mais novo jogo de fazendinha de Uwe Rosenberg”. Depois de um certo hiato de seus clássicos como Agricola, Caverna, Ora at Labora, Fields of Arle e algumas experimentações como em Banquete a Odin, o autor retorna ao básico, sem firulas, mas com algumas mudanças que podem justificar, para alguns, o novo título.
Com um olhar superficial pode-se achar que estamos falando de um jogo lançado 14 anos atrás: se aloca trabalhadores para conseguir recursos, aloca outros trabalhadores para plantar estes mesmos recursos e no final do turno ocorre a fase da produção onde se consegue os recursos plantados. Recursos estes que são utilizados para “pagar” requisitos na etapa final gerando pontos (ou evitando punições).
As diferenças, portanto, não estão na estrutura do jogo, sendo apenas com olhos um pouco mais treinados para identificá-las nos detalhes.
A alocação de trabalhadores sai da mesmice ao se tornar cada vez mais cara conforme os jogadores vão se aproveitando da mesma ação. Esta instabilidade de custos gera um organismo vivo criando situações recorrentes onde os jogadores devem tomar decisões interessantes todos os turnos.
Escolhas como entre gastar três trabalhadores numa ação muito superior ou gastar apenas um em outra claramente inferior para seus objetivos, mas manter dois trabalhadores para futuras ações. Soma-se a isto o fato de que esta oferta de espaços, como dito, está completamente ligada à procura dos jogadores por estas ações e não só se tem algo brilhante do ponto de vista do design como um tema de aula do liberalismo econômico.
Outro aspecto que, embora não seja exatamente uma novidade para o autor já que foi implementado em seu grande sucesso: Agricola, a existência de diferentes baralhos de cartas, cada um oferecendo dinâmicas distintas, abrindo caminhos para diferentes focos em cada partida.
O “pulo do gato dos detalhes”, entretanto, está na hora de se usar a carta. Enquanto outros jogos possuem uma determinada fase ou ainda uma ação de alocação para se jogar a carta, em Hallertau o jogador pode jogar uma carta a qualquer momento. Isto não só é benéfico pela liberdade que gera, mas para abrir novas opções de decisão para o jogador: “jogar agora e ter um benefício pequeno, mas importante ou jogar logo depois, perder a oportunidade do benefício imediato, mas conquistar mais recursos no futuro?”.
Os campos também receberam uma mudança sutil, mas agradabilíssima, dando ao jogador a opção de não produzir para recuperá-lo e produzir mais num futuro turno ou trabalhá-lo todas as rodadas por um mínimo de produtividade. Algo tão simples e bem pensado que é estranho que nunca tenha sido implementado.
Por fim, como todo jogo de fazenda há o momento do pagamento de recursos. Ao contrário de outros jogos onde se deve pagar alimentos para os trabalhadores para não perder pontos, em Hallertau se paga produtos com o objetivo de conquistar mais trabalhadores e gerar pontos. É uma diferença sutil, sim, mas tira a impressão de estar sempre com a corda no pescoço ameaçado com medo de uma punição petrificadora e dá, ao menos a impressão, de estar mais aberto as experimentações.
Estas alterações mostram que Uwe Rosenberg, mesmo quando não busca reinventar a roda, consegue criar uma experiência sólida e diferente o suficiente de outros títulos anteriores.
Pontos positivos
Pequenas mudanças, grandes diferenças – A base de um jogo de fazenda ainda está aqui em Hallertau, mas em vez de apostar em ideias alienantes, como o “Tetris” de Banquete a Odin, Uwe inovou em partes importantes da estrutura mostrando algo diferente sem gimmicks.
Liberdade, liberdade! Poder jogar as cartas a qualquer momento é como usar óculos pela primeira vez. Depois de anos de miopia, sendo controlado por sistemas de jogo que obrigam a realizar as ações em momentos específicos, agora é possível fazê-lo quando queremos. Hallertau, com esta simples mudança, fez todos os outros jogos ficarem um pouco menos interessantes.
Aloque aqui ou ali. Apesar de ser uma mecânica consagrada, a alocação de trabalhadores não permite muitas manobras. A solução encontrada em Hallertau é suficiente para parecer diferente, mesmo mantendo a estrutura básica.
Pontos a considerar
Sorte – Se nos jogos antigos Uwe evitava a sorte de diferentes formas, agora ele a abraça. Da forma como as cartas são distribuídas aos jogadores há sempre a possibilidade de um jogador ser mais beneficiado que outros pela simples sorte na hora da compra. Isto vai ficando mais evidente conforme o fim da partida, quando uma compra de desespero pode render vários pontos, ou nenhum.
Meu dia de Stardew – A evolução do “Centro comunitário” é interessante, mas não deixa de ser uma nova forma de direcionar a produção e gastar recursos gerados, não muito diferente de pagar alimentação para os trabalhadores. De todas as novidades, é a com maior apelo visual, mas a que menos altera a estrutura dos jogos de fazenda.
Pontos negativos
Ainda um jogo de fazenda do Uwe – Se as mudanças estão nos detalhes e não na estrutura geral é possível fazer o argumento de que é mais do mesmo. Não é, mas é preciso um pouco de boa vontade do jogador para perceber isto.
Conclusão
Apesar de mecanicamente mais simples que seus jogos de fazenda mais antigos, Hallertau mostra que Uwe Rosenberg ainda consegue criar jogos que são deliciosos de jogar, bem estruturados e desenvolvidos. Se dificilmente fará o mesmo sucesso que Agricola teve no seu lançamento em 2007 pela inovação que este o foi na época, é difícil argumentar que não está ombro a ombro com os melhores títulos do autor e, portanto, um dos melhores títulos já lançados para quem gosta de jogos estratégicos.